sexta-feira, 28 de setembro de 2007

TECNOLOGIA – REATOR DE PLASMA TRANSFORMA O LIXO EM ENERGIA ELÉTRICA

Empresa de Campinas e institutos de pesquisa testam alternativa com o superaquecimento de gases
Um grupo de dez pesquisadores do Instituto de Pesquisa Tecnológica (IPT), Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) e da empresa campineira Multivácuo está desenvolvendo um reator de plasma para transformar lixo em energia elétrica. Considerado o quarto estado da matéria, o plasma é produzido após o superaquecimento de gases por meio de descargas elétricas. A vantagem do uso da chamada “tocha de plasma” em relação à incineração comum do lixo é que ele atinge temperaturas muito mais altas, que podem ser elevadas ou reduzidas com rapidez, fazendo com que sobrem poucos resíduos e com baixa produção de substâncias contaminantes e dioxinas.

“Não somos os únicos a desenvolver essa tecnologia, há outros pesquisadores no Japão e na Europa fazendo o mesmo trabalho”, diz Antonio Carlos da Cruz, pesquisador do Grupo de Plasma do IPT. O grupo está trabalhando em conjunto desde 2005, quando recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para realizar os estudos preliminares.

A primeira fase foi para avaliar como funciona a degradação e a gaseificação de diferentes materiais encontrados nos lixões. Dois reatores foram desenvolvidos no IPT para a realização das pesquisas com as tochas de plasma. Agora um novo reator será construído com verba do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe) da Fapesp.

Maior, o novo reator será acoplado a uma turbina e a um gerador para produção de energia elétrica. Com isso, poderá ser calculado o poder calorífico dos diferentes materiais e o excedente de energia que pode ser gerado no processo. O reator poderá receber 100 quilos de resíduos de cada vez.

Processo

O processo começa com a formação do plasma, que pode ser gerado a partir de qualquer tipo de gás. As temperaturas do plasma térmico são controladas e podem chegar normalmente a 15 mil graus centígrados. Com o plasma na temperatura escolhida, é colocado no reator o lixo, que é dissolvido e forma gases não-tóxicos de alto poder calorífico.

Esses gases vão então para uma turbina, que movimenta o gerador e produz energia elétrica. Parte dessa eletricidade volta para o próprio reator para a geração do plasma e a que sobra pode ser destinada a outras finalidades. Além de produzir energia para o seu próprio funcionamento, reduzindo custos no processo de tratamento do lixo, o reator pode até dar lucro com a comercialização da energia.

O que os pesquisadores vão avaliar a partir do ano que vem, quando o novo equipamento deve estar funcionando, é a capacidade de produção de energia elétrica dos resíduos e o potencial econômico da produção excedente. Como não existe atualmente nenhum reator funcionando em alta escala, só existem cálculos teóricos indicando que cerca de 15% da energia produzida pode ser excedente.

Outra vantagem é que os resíduos do processo também podem ter finalidades comerciais. Metais, cerâmicas e outros materiais que não viram gases acabam se fundindo e formam uma substância parecida com lava vulcânica. Ela é escoada do reator e esfriada rapidamente, se transformando em um material que pode ser moído e usado como brita em pavimentação de ruas. “Mesmo os metais pesados que ficam nesse material não oferecem risco, pois ficam aprisionados e não contaminam água ou o solo”, diz Cruz.

Multivácuo A empresa Multivácuo foi criada em 1999 em Campinas por especialistas nas áreas de química e física do ITA e da Unicamp. Ela atua assessorando empresas na área de vácuo, filtros, fumigações, filtros, tecnologia de ozônio, tecnologia de plasma e co-geração de energia elétrica.

No projeto do reator de plasma, a empresa atua junto com o IPT e ITA, mantendo a pesquisadora Maria Antonia dos Santos como coordenadora da pesquisa. Além de participar da pesquisa, a empresa cuidará da comercialização da tecnologia para empresas interessadas.

Quarto estado da matéria está em 99% do Universo

O plasma é chamado de quarto estado da matéria por ter características diferentes dos estados sólido, líquido e gasoso. Um exemplo simples dos quatro estados seria o de um cubo de gelo, que é água em estado sólido. Aplicando uma fonte de calor, ele se torna líquido, e aumentando mais a temperatura, ele vaporiza e vira gás. Se a temperatura for subindo mais, esse gás se transformará em plasma.

Com temperaturas muito altas, os átomos do gás entram em movimentação cada vez mais intensa e a colisão entre eles faz com que os elétrons sejam expelidos. Isso transformará o gás em uma região onde coexistem elétrons livres, íons e átomos neutros. Esse processo é chamado de ionização do gás, que o transforma em eletricamente neutro.

O plasma existe na natureza, como nas chamas, descargas atmosféricas e aurora boreal. No Universo ele ocupa 99% da matéria visível, sendo que apenas 1% estão em estado sólido, líquido ou gasoso. O Sol, estrelas em geral, galáxias e nebulosas estão em estado de plasma. O plasma também tem várias aplicações no cotidiano das pessoas. Lâmpadas fluorescentes, por exemplo, são formadas por plasma de baixa temperatura. Telas planas, aparelhos de esterilização e filtros em veículos também utilizam o plasma.

O ideal é incineração a altas temperaturas

Queima de resíduos diminui a produção de substâncias tóxicas que contaminam o meio ambiente

Existem três destinações básicas do lixo em todo o mundo. A mais comum é a colocação em lixões, que provoca a contaminação de solo e água, exala odores e atrai roedores e insetos. Outra é a colocação em aterros, que são forrados para evitar a contaminação de solos e contam com tratamento de gases e resíduos, em especial o chorume. A terceira forma é a incineração, ideal para quem tem problemas de espaço para acondicionar o lixo. No Japão, há cerca de 1,8 mil incineradores espalhados por todo o país.

A incineração comum é feita na temperatura média de 800 graus centígrados. Isso não elimina resíduos tóxicos e substâncias contaminantes, como o mercúrio de lâmpadas fluorescentes, por exemplo.

Além disso, o processo de queima nesse nível de temperatura gera a produção de dioxinas. As dioxinas são formadas quando moléculas de cloro na presença de matéria orgânica são submetidas a altas temperaturas. É uma substância altamente perigosa, que pode causar câncer, deformações em fetos e causar deficiências imunológicas similares à Aids. Para evitar que as dioxinas vão para a atmosfera contaminando plantas e animais, é feito um processo de filtragem nos incineradores.

No processo feito no reator de plasma, a alta temperatura e o controle que permite aumentar ou diminuir rapidamente o calor diminui a produção de dioxinas. “Não podemos dizer que não é produzida nenhuma dioxina, mas a quantidade é muito menor que no processo normal” , diz o pesquisador Cruz.

Quando reatores a plasma puderem ser usados em escala industrial, o problema de lixo em fábricas, hospitais e nas cidades em geral será muito menor que o enfrentado atualmente. Não haverá necessidades de grandes espaços para acondicionamento do lixo e os resíduos auxiliarão na pavimentação de ruas e estradas.

Apesar disso, o pesquisador Cruz diz que o ideal é que seja ampliado o trabalho de separação e reciclagem da maioria do material que vai para o lixo. “Acredito que 90% do lixo poderá ser reciclado, sendo que os 10% restantes poderiam ser destinados aos reatores”, diz.

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